"Era um saco no chão. Um resto de nada, dentro de um saco térmico. Perdido na rua, esquecido na grande azafama da rua de um bairro de Lisboa. Quem o deixou, esqueceu-se que o caixote do lixo ficava mais à frente, local onde o saco teria ido parar ao fim do dia, se não tivesse acontecido o improvável. O saco emitiu um som e revelou que estava lá dentro um ser vivo. Um cão, um gato, um animal qualquer. Como não é normal que os sacos tenham um animismo próprio, alguém reparou na estranha ocorrência e chamou a polícia. Já alguém disse que o mundo é um lugar perigoso e por isso o melhor é não facilitar mesmo com um saco térmico. Foi, pois, a polícia quem descobriu que o saco se movia porque lá dentro estava de facto um ser vivo. Mas embora pertencesse ao ramo dos mamíferos, não era nem um cão, nem um gato. Era um bebé, equipado com placenta e cordão umbilical. Acabado de nascer e largado na rua por uma mãe ou um pai que manifestamente não o queria. Deixado na rua para morrer. Foi salvo por um desígnio qualquer. Uns dirão que foi o divino, eu, que não sou dada a estas coisas. Estremeci. No dia seguinte, os portugueses ficaram a saber que o referendo sobre a despenalização do aborto já tem data." Júlia Pinheiro in "24 horas" em 30 de Novembro de 2006.
Um dia o amor virou-se para a amizade e disse:
- Para que existes tu se já existo eu?
A amizade respondeu:
- Para repor um sorriso onde tu deixaste uma lágrima.
"We're all water from different rivers. One day we'll find us in a same ocean and evaporate together".
Lembra-te
que todos os momentos
que nos coroaram
todas as estradas
radiosas que abrimos
irão achando sem fim
seu ansioso lugar
seu botão de florir
o horizonte
e que dessa procura
extenuante e precisa
não teremos sinal
senão o de saber
que irá por onde fomos
um para o outro
vividos
Mário Cesariny - Poeta e Pintor - (1923 - 2006)
Até sempre
"Como podemos saber se aquela pessoa ao nosso lado ou nós mesmos, um dia, de repente, perdemos o norte, perdemos a razão e somos levados ao extremo e passamos para o outro lado da fronteira da sanidade? O suicídio é um acto de coragem ou de cobardia? Existem razões que justifiquem tirar a própria vida ou quem o faz não deve explicações a ninguém? A vida tem muitas mais perguntas do que respostas e, pior do que ter dúvidas, é ter certezas absolutas. Quem as tem são, invariavelmente, os inquisidores, dispostos a enviar os outros para a fogueira da maldição eterna. Ao ler nos jornais o relato da mãe que se suicidou e assassinou, também, os dois filhos, Catarina, de 10 anos, e António Manuel, de 7, não tenho um único sentimento por esta mulher que não seja ódio.«vou matar-me e tu vais ficar sem as duas coisas que mais amas no mundo»: foi o que ela escreveu ao marido antes de partir de casa, pegar nos filhos em pijama e mergulhar o automóvel nas águas. Se o inferno existe, ele é pouco para esta mulher. Não há perdão possível, compreensão possível, para qualquer um de nós e, principalmente, para quem é mãe. Não quero saber as razões do lado negro da alma desta mulher. Não quero sequer escrever o seu nome. Apenas quero acreditar que Deus me perdoe a mim por esta raiva sem limites perante alguém capaz de matar, assim, duas crianças frutos do seu corpo. Dois seres que tinham direito a uma vida pela frente. A rir e a brincar no seu mundo infantil, até a mãe lhes roubar tudo." Luisa Castel-Branco in "Destak" em 23 de Novembro de 2006.
"Pudéssemos nós pegar num dia, ou talvez num instante apenas, naquele momento mágico em que tudo foi perfeito, extraordinário. Soubéssemos nós guardar para sempre esse momento, emoldurá-lo na nossa memória, na do coração, na da alma e não a outra que guarda os dados da vida de todos os dias. Porque a magia é isso mesmo. É algo que a realidade não comporta e ao mesmo tempo é a mais pura realidade, porque obscurece tudo o resto e o universo aquele instante. E é como se tudo o resto, de súbito e sem mais explicações, tivesse ficado para trás, numa outra realidade, e só nós e a circunstância desse momento somos o cosmos, o todo. Para cada um, este ápice, esta paragem do relógio da vida, pode ter milhares de formas ou cores diferentes. O primeiro beijo. A primeira vez que olhamos o nosso filho. O cheiro da terra molhada ou o pôr do sol, ou simplesmente o nada quanto estamos de mãos dadas com quem amamos. Ou os corpos deitados no leito depois de ter havido muito mais do que sexo, amor e a cumplicidade total. Ou então o acordar de manhã e saborear o estar vivo. As folhas que perdem o verde e se transformam num castanho dourado e depois cobrem os passeios. As crianças que riem no jardim da escola. Sentir a falta de quem amamos e está ali a nosso lado. Não sei. Apenas sei da obrigação que temos para connosco de salvar estes instantes mágicos e depois, ir busca-los ao fundo da alma, quando os dias são negros, pesados e as noites longas.." Luisa Castel-Branco in "Destak" em 07 de Novembro de 2006.
"Existem milhares de pequenos mistérios sem explicação, sem que consigamos apercebermo-nos, dos porquês, e, muitas vezes, sem sequer darmos por eles. Poder ser tão simplesmente o brilho das folhas molhadas pela chuva, que reflectem um sem número de cores numa só. Ou o perfume mágico de um bebé, a fragrância mais inesquecível de todas. Ou o teu sorriso quando acordas de manhã, despenteado, as brancas que quase já tomaram conta do teu cabelo, e cada uma das tuas rugas é uma história só nossa. Ou então o cair da noite, quando a cidade se despede e entram em cena os habitantes do outro lado do mundo, os vivos e os mortos, numa confusão de universos paralelos . Pode ser o cheiro da roupa lavada, dos cabelos húmidos, o odor característico do nosso lar, ou da nossa infância, porque também as recordações têm aroma, texturas, cores. Ou aquela dor que vem sem aviso e nos tolhe o coração. Da saudade que ainda não foi, do amor que já partiu e se desvaneceu no tempo mas nunca dentro de nós. Dos mistérios da vida, os mais fantásticos são os mais humildes e infinitamente pequenos e tão breves. As histórias de amor, de paixão ou desassossego de alma, as lágrimas da tristeza que de tão silenciosa corta o espaço como uma lamina, as noites solitárias, tudo isto e muito mais guardamos dentro de nós em pedaços mínimos, insignificantes. E quando as lembranças nos tocarem de mansinho, se calhar é o cheiro da roupa lavada, a cor da folha molhada, o perfume da tua ausência que tudo explicam sem mais nada de necessário." Luisa Castel-Branco in "Destak" em 02 de Novembro de 2006.
. Foi tudo uma MENTIRA pega...
. PEIXINHA
. para ti.....com carinho.....
. Hoje